A estupidez não escolhe camisa e veste até jaleco

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28 de Agosto de 2013 por ofutebolinteligente

Um dos comportamentos mais repugnantes e estúpidos de certos tipos de torcedores brasileiros é ir ao aeroporto protestar contra o próprio time. Do Oiapoque ao Chuí não há clube de grande torcida que já não tenha sido recepcionado com ofensas, vaias, chuva de pipoca e até agressões físicas no desembarque após uma derrota acachapante fora de casa. Os casos são infindáveis, tornou-se até corriqueiro, só muda a cor da camisa e o nome do time que está em má fase. No entanto, o que imaginávamos ser ignorância exclusiva de aficionados por futebol, geralmente cegos pela paixão clubísitica, parece afetar também alguns membros das mais altas castas as sociedade brasileira.

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Torcida do Galo hostiliza time em Confins após derrota, em 2011

No caso dos torcedores, a ação sempre foi condenada por boa parte da opinião pública. Primeiro pela covardia do ato de ameaçar ou agredir um cidadão que está exercendo sua profissão (no caso, o jogador que chega de uma viagem de trabalho). Depois pela ingenuidade e incoerência. Que direito um torcedor tem de cobrar dessa forma de um atleta? Se, no entender daquele que protesta, o jogador é tão desqualificado tecnicamente para vestir a camisa do time, a culpa é de quem o contratou, certo? Sem falar que apenas um esporte, por mais importante que ele seja para algumas pessoas, não justifica tais atitudes. Seria mais inteligente outra forma de manifestação.

Também é intrigante a disposição dessa turma de ir até os terminais que, em alguns casos, ficam muito distantes do centro da cidade, como em BH. Encarar 40 ou 50 quilômetros de estrada numa segunda de manhã, só pra ofender alguém por causa de futebol é um tanto quanto curioso. Além de tentar imaginar que tipo de ocupação ou ofício possuem essas pessoas para estarem livres e com dinheiro para realizar tal deslocamento, já pensei também como seria se elas tivessem tal energia e vontade para lutar contra determinadas injustiças sociais e protestar contra mazelas políticas, etc.

Algo bem utópico, afinal, os responsáveis pelos tumultos nos aeroportos costumam ser os mesmos das brigas no entorno do estádio e no metrô. Ou pelo menos vestem as roupas das mesmas torcidas organizadas. Enfim, não dá pra imaginar que gente que se agride costumeiramente por causa de time seja capaz de se preocupar com algum bem coletivo, ou com questões tidas como “mais importantes” para a sociedade, tipo a saúde pública, por exemplo.

Isso que acontece no contexto do futebol serve para ilustrar o quanto é errado e covarde atacar pessoalmente aqueles que são apenas peças menores de uma grande engrenagem, como fizeram os médicos de Fortaleza que hostilizaram os profissionais cubanos que chegavam  para fazer parte do programa Mais Médicos, do governo federal.

Não vamos aqui discutir a saúde pública/privada no Brasil, nem o programa, apenas a atitude dos cerca de 50 médicos cearenses. Por que atacar verbalmente um médico cubano, com vaias e o chamando de escravo, sendo que ele não tem culpa alguma da manobra política que está por trás da vinda deles? Se os médicos brasileiros exigem que o diploma dos estrangeiros seja validado por meio de um exame, por que gritar na cara de Juan, Félix e Mercedez? Não são os cubanos que decidem se a prova deve ou não ser aplicada.

É como ir ao aeroporto ofender os jogadores que perderam, sendo que o clube deve salários, é mal gerido e contratou errado no início da temporada. Para o jogador, parte mais frágil e exposta dessa estrutura, é que sobram os insultos e a humilhação.

Como dissemos antes, é ingênuo, incoerente, covarde e mal direcionado. O agravante nessa história, quando no contexto dos médicos, é que ameaçar, vaiar, insultar e hostilizar um profissional que vem de fora para trabalhar em seu país é também xenofobia. Não importa em quais circunstâncias ele veio e irá trabalhar, mas o respeito ao cidadão estrangeiro é obrigatório, sempre. Que cenas como as de Fortaleza e essas abaixo não se repitam.

Pedro Galvão

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